Daqui a nada é inverno, não é?



O mal do nosso amor foi ter durado as 4 estações. Em repeat. Mas o verão já chegou ao fim, não vieste e eu não esperei por ti. Nos raros momentos em que os teus lábios se curvam para me sorrirem e a tua voz tenta roubar-me às rotinas, substituo-te de imediato pela severidade das minhas lutas.

 Às vezes, fazes-te dono dos meus pensamentos, mas só às vezes. Não posso ver o mar sem te imaginar tripulante de um navio que se faz às tempestades e finta os icebergs do atlântico norte. Há memórias que doem como escaldões na pele. 
A eternidade abriu caminhos que sepultaram a nossa história no fundo do tempo mas nós esperámos sempre o inverno seguinte. Aquele que anunciaria o teu regresso. Numa manhã de dezembro, chorona e cinzenta como todas as manhãs de dezembro, haveríamos de trocar o cheiro da terra molhada pelo da canela nos crepes de maçã. Verão e outono a ouvirmo-nos as vozes de longe como o som do mar de dentro de um buzio, os “amo-te” fazendo eco nas linhas de telefone cruzadas, e o meu coração a mirrar, de dia para dia, tal era o aperto, o sexto sentido, a premonição…já nos tínhamos dissolvido em espuma…nós é que não sabíamos.
 O inverno que já era triste e vazio como as conchas na areia tornou-se lúgrebe. Por todo o lado, os meus ouvidos intuíam uma lenta marcha fúnebre. Coisa de louca que se deixou de encantar com o mar que te afogou em lembranças. E foi então que os invernos se tornaram malditos plagiadores de lágrimas. Se eu chorava, eles choviam. O mal do nosso amor foi ter durado as 4 estações. Em repeat. 

A cada novo Outono que antecede a tua morte eu sou sorvida por partículas de um passado que se move entre as moléculas de oxigénio e respiro-as…a cada novo inverno revivo-te…sabes que reviver pode ser uma tortura… Reviver pode pôr-nos em fuga da felicidade, ainda que fujamos da felicidade dos outros quando a nossa já fugiu de nós. Vale-me sempre, claro, a severidade das minhas lutas. Ou não suportaria a visão romanesca dos casais que se passeiam pelas ruas e se tocam os dedos dos pés nas suas camas mornas. 
Vem aí o outono, sabes? E noutros outonos eu ainda era feliz. Jantares a dois e flores na mesa, velas a brilhar no escuro e o tilintar dos copos de vinho. Trocámos mimos e fizemos viagens num desfio de planos para um futuro breve. 
Haveríamos de ser felizes ao ponto de se roerem de inveja soturna e febril, as fulanas que te cobiçavam, que eu bem as via pelo canto do olho numa linguagem gestual despudorada, mensagens codificadas nos olhares e trejeitos do corpo. Haveriam elas de querer rever-se em cada confissão pirosa, a cada vulgar escapadela que eu pespegasse online. Só para que soubessem do nosso destino comum haveria de nos fotografar a partilhar mantas à lareira. 
Ao invés disso, o outono que vejo ao pé da porta não te traz. Vem sem ti e não nos deixa cumprir afinal o tal destino comum. Borrifou-se para os beijos ensonados a meio da noite e para as nossas mãos dadas ao entardecer. 
Queria alardear a minha sorte, abençoada de mim que ao teu lado sonharia sem pesadelos… Mas já é outra vez outono e nada daquilo que imaginei aconteceu, entretanto. Não me curo, não cicatrizo. Lambo ainda feridas até à exaustão, e não renasço nem reavivo chamas cúmplices e despertas para o altruísmo do amor. 
É Outono. As noites serão entretanto enormes e os dias imperfeitos como um poema inacabado. A eternidade abriu caminhos que sepultaram a nossa história no fundo do tempo mas nós esperámos sempre o inverno seguinte. Daqui a nada é inverno, não é?

AK in A Lenda do Havn

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