And the oscar goes to...

Acredita que vou tendo outros. Claro que vou tendo outros.
 Não encontrei até hoje outra forma de te sentir, senão ver-te em pequenas coisas que eles têm de ti. A curvatura dos lábios que me parece a tua, as falhas capilares onde detenho as mãos ou a forma como me encostam à parede. 
Tu não sabes, mas o que eles encontram quando me adentram é o mesmo que descobrem numa sala vazia, e tudo o que me ouvem é o eco do que te digo. Tu não sabes, mas depois da explosão de vida que me foste, os outros não passam de riscos na minha parede, balanço estatístico, contabilidade organizada… na melhor das hipóteses, de um qualquer nome colectivo. 
Não te comparo? É mentira. Passo a vida a fazê-lo, a procurar-te neles, um sinalinho aqui, outro acoli, uma mania, um vício, um defeito de fabrico, eu a controlar-lhes a qualidade, a gemer por exaspero… não, não, afinal não és tu… É como se todos os que vieram depois de ti fossem aspirantes ao que tu foste. Meros candidatos a um lugar que nem sequer está vago. Tu foste o gesto, a absoluta coincidência da perfeição do gesto. Foste o segundo que antecede a morte, o relance do meu nascimento, foste o meu renascimento. Abri os olhos no momento em que te vi, respirei pela primeira vez o ar quando me beijaste.
 Hoje, és talvez… o resíduo desse primeiro beijo e o resquício da dor de parto. Mas importa-me o que foste, muito mais do que o que és. E tu foste uma boa ideia. Não… tu foste muito mais do que uma boa ideia. Tu foste uma estória que dava um filme! Dava-te um óscar, sabes? Pelo melhor argumento, melhor actor, melhor banda sonora. Óscar, Emmy, a Palma de Ouro do festival de Cannes. Medalhava-te como a um herói ex-combatente na Guerra Colonial, no Vietname, no Kuwait. Medalhava-te e pronto… por todos os minutos em que me fizeste feliz.
 Depois de ti, os outros não passam de uma desculpa esfarrapada, verbos de encher os meus dias, tempo a mais que tenho entre mãos. Amo-os por bondade, como se me tivesse tornado freira, voluntária em África ou puta altruísta. Não, a culpa não é deles. Nem tua, tão pouco. A culpa é do buraco negro que escavaste em mim. O mesmo onde me afundo de cada vez que me sinto a morrer por dentro.


AK


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