Eça é que é essa!

Nada contra os escritores mortos. Bem pelo contrário. Não amar a obra de Fernando Pessoa, por exemplo, é quase o mesmo que dizer que não se gosta de ler livros em português, ou melhor, é o mesmo que dizer que não se gosta de ler nada. Mas o Eça...e os Maias do Eça...sejamos honestos, a maioria de nós quando o leu na escola não gostou. Vomitou-se para cima dele. 
O Eça não é o meu escritor preferido, como se pode facilmente notar, mas o problema não é ler o Eça. O problema é ser-se obrigado a lê-lo quando se tem 16 anos. 
Reconciliei-me com o Eça já tinha os meus 20 e poucos, e aprendi duas coisas sobre o Eça: A primeira, é que é preciso querer lê-lo. A segunda, é que é preciso ter paciência para lê-lo. Coisas que numa idade tão precoce não estão ali à mão de semear. 
Posto isto, não fico chocada que se tire uma obra tão complexa quanto os Maias das leituras obrigatórias nas escolas. Além do mais, descansemos. O Eça continuará a ser lido. 
Ao professor caberá a escolha de uma obra e essa flexibilidade permitirá ao professor, percebendo que turma tem à sua frente, qual a obra que melhor encaixará ali. Porque o mais importante, penso eu, é incutir nos miúdos o gosto pela leitura. 
Não vivemos hoje tempos iguais aos nossos, quando estudávamos. Farto-me de o dizer: até aos meus 20 anos li centenas de livros. 
Li imensos às escondidas. Ouvi muitos resmungos quando era apanhada - "não tens mais nada para fazer?" 
Ler tem que ser um ato voluntário, uma coisa que se faz por gosto. Quando imposta, como tudo o resto, causa repulsa. 
Hoje, as distracções são imensas. Até nós, adultos vamos lendo menos. Quantos de nós, depois do jantar e a cozinha arrumada, se senta imediatamente num sofá com um livro na mão? A maioria liga o computador, vem para o facebook e só depois de duas ou três horas nisto, abre um livro, já na cama, para ler algumas páginas. E que bom seria se ao menos fizéssemos isto. Todos e todos os dias. Tendo em conta esta realidade, parece-me que verdadeiramente importante é puxar outra vez as pessoas para o prazer da leitura. E aos mais jovens é preciso ensinar-lhes isso. Mas, duvido que os Maias e as suas (para os miúdos) aborrecidas descrições da "flor de pétalas ovaladas e amarelas, cuja raiz se afunda na terra áspera e ocre, quase em aridez, infecunda, como terra vermelha africana, ali, despojada num vaso pintado de verde-limão"...sirva para isso.

Ana Kandsmar

BIS - Os Maias

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