Dos desamparos, das desistências e do profundo desejo de continuar a existir...




Quando a luz se apagar nos meus olhos
E soar a música orquestrada,
Quando tombarem flores sobre o meu corpo
E a minha vida se resumir a nada



Ouçam-me em tudo o que não ouvem
Vejam-me algures no pó da estrada
Imaginem-me brisa ou arvoredo;
Ou qualquer outra coisa intercalada
Que possam ouvir só em segredo


Quando se apagar esta luz dos meus olhos
E a minha voz ficar, então, calada
Ainda que por tão breves instantes 
Será meu, o eco da montanha?
Serão minhas as palavras sussurrantes?

De entre um jardim na primavera

Serei pássaro, terei asas?
Verei a vida como era,
O meu riso imortal pelas casas,
Como um sonho ou uma quimera?

Na vossa face, o meu beijo adocicado

O abraço, tão apertado como dantes
As memórias mais doces do passado
Voltarão a ser reais por uns instantes.

Quando a luz se apagar nos meus olhos

E o relógio ficar parado
No exacto minuto em que me extingo
Será, para sempre, o marco errado
Daquela hora triste em que me findo.

E a luz, nos meus olhos apagada

a sombra obliqua de um caminhante
Ou um pássaro que bate asas, de rompante?
Talvez, não seja nada...


Ana Kandsmar


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